domingo, 23 de dezembro de 2007

Democratização Cultural X Favela

Antropofagia periférica
Lançado em 1997, o disco dos Racionais MCs, Sobrevivendo no Inferno, teve um importante papel na disseminação do orgulho de pertencer à periferia. O empreendimento mostrou a real possibilidade de produzir cultura em um meio que não o oficial. E depois da música, seja por meio do hip hop, do samba ou do funk, é a vez do audiovisual e da literatura, por tanto tempo restritos às classes mais abastadas.
Fruto dessa democratização cultural forçada dos meios culturais, a Semana de Arte Moderna Periférica acontecerá entre os dias 4 e 11 de novembro, em São Paulo. Encabeçado pela Cooperifa - sarau que democratiza o acesso à poesia – com o apoio da ONG Ação Educativa, o movimento aproveita o espírito canibalista da Semana de 1922 para digerir a cultura a partir de uma forte visão sociopolítica, o que o difere do evento original focado na estética.
A Semana de 2007 mostra que há um movimento cultural legítimo sendo construído às margens da sociedade e que a necessidade de pensar, produzir e viver cultura se sobrepõe ao pouco ou nenhum acesso aos bens culturais. “A ‘cultura oficial’ vai comer o biscoito fino feito pelos artistas periféricos”, diz Eleilson Leite em alusão direta à fala de Oswald de Andrade, oitenta e cinco anos atrás – "A massa ainda comerá do biscoito fino que fabrico”.


Conheça o Manifesto da Semana de 2007:
Manifesto da Antropofagia Periférica
A Periferia nos une pelo amor, pela dor e pela cor. Dos becos e vielas há de vir a voz que grita contra o silêncio que nos pune. Eis que surge das ladeiras um povo lindo e inteligente galopando contra o passado. A favor de um futuro limpo para todos os brasileiros. A favor de um subúrbio que clama por arte e cultura, e universidade para a diversidade. Agogôs e tamborins acompanhados de violinos, só depois da aula. Contra a arte patrocinada pelos que corrompem a liberdade de opção. Contra a arte fabricada para destruir o senso crítico, a emoção e a sensibilidade que nasce(m) da múltipla escolha. A Arte que liberta não pode vir da mão que escraviza. A favor do batuque da cozinha que nasce na cozinha e sinhá não quer. Da poesia periférica que brota na porta do bar. Do teatro que não vem do “ter ou não ter...”. Do cinema real que transmite ilusão. Das artes plásticas que, de concreto, querem substituir os barracos de madeira. Da dança que desafoga no lago dos cisnes. Da música que não embala os adormecidos. Da literatura das ruas despertando nas calçadas. A Periferia unida, no centro de todas as coisas. Contra o racismo, a intolerância e as injustiças sociais das quais a arte vigente não fala. Contra o artista surdo-mudo e a letra que não fala. É preciso sugar da arte um novo tipo de artista: o artista-cidadão. Aquele que na sua arte não revoluciona o mundo, mas também não compactua com a mediocridade que imbeciliza um povo desprovido de oportunidades. Um artista a serviço da comunidade, do país. Que armado da verdade, por si só exercita a revolução. Contra a arte domingueira que defeca em nossa sala e nos hipnotiza no colo da poltrona. Contra a barbárie que é a falta de bibliotecas, cinemas, museus, teatros e espaços para o acesso à produção cultural. Contra reis e rainhas do castelo globalizado e quadril avantajado. Contra o capital que ignora o interior a favor do exterior. Miami pra eles? “Me ame pra nós!”. Contra os carrascos e as vítimas do sistema. Contra os covardes e eruditos de aquário. Contra o artista serviçal, escravo da vaidade. Contra os vampiros das verbas públicas e da arte privada. A Arte que liberta não pode vir da mão que escraviza. Por uma Periferia que nos une pelo amor, pela dor e pela cor. É TUDO NOSSO!Sérgio Vaz, poeta da Cooperifa.

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